Avaliar o tempo em que se vive é sempre uma tarefa árdua e de certa forma fadada ao fracasso, uma vez que estando influenciados por nossa própria época acabamos por comprometer uma busca pela imparcialidade. O ideal é sempre uma análise mais distante, futura, onde o transcorrer dos anos permite enxergar de maneira mais adequada como as coisas realmente aconteceram. Mas isso não impossibilita que continuemos a indagar e refletir nosso contemporâneo, buscando respostas para entendê-lo. Mesmo que comprometidos com ele e por isso construindo uma visão parcial, muitas vezes as respostas são surpreendentemente satisfatórias.
Conversando esses dias com uma amiga estivemos juntos pensando um pouco na literatura dos dias de hoje e no que ela reflete nossa sociedade. Se voltarmos no final do século XIX iremos perceber que predominavam os romances psicológicos, muito fortes na literatura russa e com ecos em outras partes do mundo, como é o caso de Machado de Assis no Brasil. Já no início do século XX parece haver duas correntes literárias principais que se desdobram a partir de autores consagrados. De um lado surge, com Kafka, o absurdo como lógica da vida, que se repercute em autores como Jorge Luis Borges e em movimentos como o realismo mágico na América Latina, cujo principal expoente é Gabriel Garcia Márquez. De outro lado surgem as narrativas a partir do “fluxo da consciência”, expressão de William James, manifesta nos romances de James Joyce e Marcel Proust e que se repercutem em diversos autores, como Virginia Wolf, William Faulkner e Oswald de Andrade. Essas duas tendências arrastam-se até o presente, onde começa a haver uma originalidade nos escritos dos autores da atual geração.
Lendo a revista literária norte-americana Granta, que conta com jovens autores e já teve contos de pessoas como Coetzee e Vargas Llossa em início de carreira, é possível perceber um estilo extremamente comprometido com a realidade, com todo seu coloquialismo e com uma linguagem marcada fortemente pela velocidade das imagens do cinema. O curioso é que os contos não versam sobre detalhes do cotidiano que escondem questões de interesse universal, mas numa grande parte das vezes tratam de assuntos autobiográficos, sobre detalhes muito particulares, sendo muito deles contendo fatos desagradáveis. Como disse minha amiga referindo-se a uma crítica que havia lido, estes contos ficam muito presos a especificidades.
Em um de seus poemas Maury Rodrigues da Cruz afirmou: “A incerteza do futuro nos faz demorar sobre as vitórias”. O triste é que na pós-modernidade, há incerteza não só do futuro como também do presente, o que leva as pessoas a se demorarem até mesmo sobre seus fracassos. É como se qualquer registro, positivo ou não, pudesse testemunhar uma existência numa época em que tudo se desfaz rapidamente e existem dificuldades para cada um em construir sua identidade. Assim, narrar do modo mais real possível quaisquer fatos, ainda que insignificantes, oportuniza para o autor um sentido qualquer para a vida, num mundo onde há carência cada vez maior disso.
Diante disso percebe-se o compromisso que o Espiritismo tem em proporcionar através do Centro Espírita um local diferenciado que ensine para cada um a permanência das mudanças, o resgate de valores e a capacidade de cada um em compatibilizar seus anseios com toda organização natural e cultural que o cerca, onde a literatura possa sempre significar um chamamento para um segundo olhar sobre a existência.
segunda-feira, 7 de janeiro de 2008
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